O Caminhos da Reportagem que a TV Brasil leva ao ar, nesta segunda-feira (27), às 23h, histórias de filhos separados das famílias pelo isolamento da hanseníase. A reportagem do programa inédito é de Manuela Castro, jornalista da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e autora do livro A Praga – o Holocausto da hanseníase, que fala do isolamento, morte e vida nos leprosários do Brasil.
A política de isolamento compulsório para quem tinha hanseníase no Brasil deixou marcas na sociedade. Os doentes foram obrigados por lei a viver isolados nas colônias até 1986, mesmo que a cura da hanseníase fosse conhecida desde 1940. Os filhos nascidos das mulheres com hanseníase eram enviados a orfanatos conhecidos como educandários ou preventórios. As mães sequer podiam tocar no filho após o nascimento.
O coordenador jurídico do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan), Thiago Flores, explica que os filhos separados foram criados em instituições totais, sem os cuidados necessários para a primeira infância.
“Quando saíram de lá, com 18 anos, saíram sem uma profissão, saíram sem saber ler, saíram sem saber escrever, muitos foram para a rua. Esses filhos que foram separados pela hanseníase sofreram muito mais do que as pessoas que tiveram hanseníase e viveram nas colônias”, afirma.
Edson do Nascimento [foto em destaque] é um dos filhos que foram separados da família por causa da hanseníase. Aos nove anos de idade, ele viu a mãe pela primeira vez. Nessa época, conviveram por seis meses, até que ela faleceu em decorrência de um câncer. “Pelo pouco tempo que eu vivi com a mamãe, eu acho que eu… eu nunca senti tanta falta dela como eu senti depois que ela se foi”, conta Edson.
Pedro Costa também foi separado dos pais. Ele traz relatos de maus tratos que sofreu quando vivia nos preventórios. “Eu não consigo ficar ajoelhado, porque quando a gente era criança, com 3, 4 anos de idade, eles punham a gente de joelho na tampa de garrafa”, lembra. Outra marca deixada pela separação foi a falta de vínculos familiares.
A política de isolamento da hanseníase foi considerada um crime de Estado. Em 2007, a Lei 11.520 determinou o pagamento de pensão especial às pessoas atingidas pela hanseníase que foram submetidas a isolamento e internação compulsórios. Em 2023, a Lei 14.736 ampliou o número de pessoas que podem receber pensão especial por hanseníase. A nova lei estende o benefício aos filhos separados. Aproximadamente 15 mil pessoas podem ser beneficiadas. Um decreto foi publicado em dezembro de 2024 regulamentando as regras para requerimento, revisão e recurso de pensão especial destinada aos filhos e filhas das pessoas atingidas pela hanseníase.
Para Artur Custódio, assessor técnico do Morhan, a indenização, por melhor que seja, nunca vai cumprir o seu papel.
“Ela não vai restabelecer laços familiares. Ela não vai reescrever a história das pessoas a partir do momento que elas foram isoladas, não. Mas é um pedido de desculpas do Estado brasileiro”, diz ele.
Helena Gomes, que também cresceu separada da família, afirma que o Brasil precisa conhecer essa história: “aconteceram coisas horrorosas e o Brasil não sabe. O Brasil desconhece e precisa saber”.