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Antonio Pitanga quer filme sobre Revolta dos Malês chegando às escolas

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Era noite de 24 de janeiro de 1835. Um grupo de africanos, a maioria escravizada e alguns libertos, se reunia em um sobrado em Salvador (BA). Eram, sobretudo, muçulmanos trazidos à força de países como Senegal, Togo, Mali e Nigéria. Eles discutiam os últimos detalhes de um levante planejado para eclodir na manhã seguinte. Mas houve uma delação e a movimentação de soldados imperiais exigiu uma mudança de planos: o levante foi antecipado.

A mais importante rebelião urbana de escravizados do Brasil ficou conhecida como a Revolta dos Malês. Na noite de sábado (25), 190 anos após o episódio, sua história foi apresentada ao público da Mostra de Cinema de Tiradentes. O filme Malês, do diretor Antônio Pitanga foi exibido em pré-estreia em praça pública.

O longa-metragem já passou por outros festivais e estará no final de fevereiro na programação do Festival Pan-Africano de Cinema, que acontece em Burkina Faso. É a primeira vez que uma ficção brasileira foi selecionada para o principal evento de audiovisual do continente africano. Já no cinema, a estreia é prevista para o dia 10 de abril. Mas o cineasta quer que a circulação vá muito além do circuito comercial.

“O meu sonho era trazer à baila essa história que a escola não conta. E humanizá-la de tal maneira para poder interagir com o século 21. Concluída a obra, o meu sonho agora é ir para banca dos saberes, escolas, para as universidades, os quilombos. E já está acontecendo. Nós recebemos telegrama de três universidades americanas nos convidando e fomos lá para Princetown, para a Pensilvânia e para Harvard. E aqui em Tiradentes já recebi vários convites de universidades”, conta.

“O meu filme não pode ficar só nas salas de cinema frequentadas por brancos de classe média. Eles também vão ver. Mas esse filme precisa chegar às escolas, à favela e ao quilombo”, acrescenta.

Os malês, como eram conhecidos os muçulmanos negros, conheciam o alfabeto árabe, tinham domínio da escrita e grau de instrução elevado. Embora sejam os protagonistas do levante, buscaram também o apoio de outros grupos escravizados. A rebelião foi minuciosamente planejada e havia sido marcada para 25 de janeiro, por ser a data que celebra o fim do Ramadã, mês sagrado para os muçulmanos.

Os enfrentamentos duraram mais de três horas. Mais de 70 africanos morreram nos conflitos e centenas foram punidos com penas de morte, prisão, açoites ou deportações. O episódio é detalhado no livro Rebelião Escrava no Brasil, publicado originalmente em 1986 pelo historiador João José dos Reis. A obra foi a principal referência para a produção do filme.

A preparação do figurino e a caracterização dos personagens demandaram estudo aprofundado. Além disso, os atores fizeram aulas de árabe, já que há diversas cenas em que o idioma é usado.

Malês, como observa Pitanga, não é um retrato frio do episódio. O filme dá espaço para que os personagens revelem suas individualidades: seus sonhos, suas tristezas, seus amores. Segundo o diretor, houve também a preocupação de fugir do estereótipo do escravo enquanto vítima passiva. “São cabeças pensantes”, afirma.

O elenco conta com a presença dos filhos de Antônio Pitanga: o ator Rocco Pitanga e a atriz Camila Pitanga. Uma senhora branca é interpreta por Patrícia Pillar. O diretor destaca a importância do crescimento de filmes com elencos majoritariamente negros, citando também o filme Kasa Branca que estreará nos cinemas na quinta-feira (30) sob direção de Luciano Vidigal.

Rocco Pitanga vê um cenário diferente para as novas gerações. “Estou hoje com 44 anos e comecei a atuar com 20 anos. Normalmente. quando eu encontrava um colega negro em um teste, eu já sabia que era só um de nós que ia ser escolhido para fazer o personagem negro. E, de repente, estamos vendo surgir filmes aonde é possível ver vários atores interpretando personagens com as suas individualidades. Filmes que exploram os sonhos e a jornada de cada um”.

O filme vem sendo promovido ao longo da Mostra de Tiradentes, que chega à sua 28ª edição. Organizado pela Universo Produção, o evento é um dos principais festivais de cinema do país, conta com programação que se estende até 1º de fevereiro e inclui ao todo 140 filmes, além de debates, shows, oficinas, lançamentos de livros e outras atividades. Em diferentes momentos, Antônio Pitanga tem aproveitado o contato com o público para discutir sobre o seu trabalho.

O diretor faz uma comparação com o longa-metragem Ainda Estou Aqui, primeiro título brasileiro indicado para o Oscar na categoria de Melhor Filme. Segundo ele, Malês deverá construir sua própria trajetória.

“O Oscar exige estofo financeiro para fazer o lobby. O Walter Salles sabiamente buscou dar visibilidade ao filme nos países onde estão os jurados que podem decidir. O meu filme vai precisar construir seu caminho por meio dos espaços de saber. E, além disso, a Globo é sócia nessa obra. Eu tinha a responsabilidade de entregar uma série de quatro capítulos de 30 minutos cada um. Eu quero que o filme chegue nos cantos mais longínquos do país”. A série ainda não tem data para ir ao ar.

Direção

Descendente de negros escravizados, Antônio Pitanga conta que um dos principais desafios foi mediar os sentimentos. Eu precisava fazer essa história. É a minha contribuição à vida artística, à cultura, à minha cidadania. Havia uma necessidade muito grande de não trazer a raiva e o ódio e sim jogar luz sobre a própria história que o Brasil não conta”. Antes das filmagens, ele conversou com cada integrante do elenco sobre o que era a Revolta dos Malês.

Uma das preocupações do diretor foi reduzir as cenas de violência explícita. O episódio de um estupro é retratado sem mostrar rostos e de forma lateral. O açoite de escravos toma conta da tela uma única vez. Em outros momentos, o castigo é retratado a partir de diferentes estratégias de montagem.

“Eu podia ter colocado outros escravos sendo chicoteado, mas já vi esse tipo de cena. O branco sempre faz filme em que o negro é chicoteado. Eu não quero vender no meu filme que o negro é só vítima. São cabeças pensantes”, explica Pitanga.

Ele também revela como surgiu a ideia de uma cena em que os revoltosos capturam a senhora interpretada por Patrícia Pillar. Eles a abandonam acorrentada e com uma mordaça de ferro. “Em um contexto de violência, seria fácil colocar os negros escravizados matando a senhora branca. Era, inclusive, o que tinha em mão no roteiro. Um dia acordei e falei: Não! Vou colocar ela no lugar da escrava. Ali são 12 segundos. Eu também não queria uma eternidade”.

A atriz Samira Carvalho, que compôs o elenco, considerou a escolha assertiva. “A imagem é tão incomum. A gente está acostumada com essa imagem quando a figura que está sendo amarrada é a figura preta. E aí, quando a gente vê uma mulher branca, é um choque. Não a toa o público geralmente reage muito nessa cena”.

Fonte: Agência EBC de Comunicação

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Governo anuncia concurso com 2 mil vagas para a Polícia Federal

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O ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, anunciou nesta quarta-feira (29) a realização de um novo concurso da Polícia Federal que vai preencher 2 mil novas vagas, ampliando o número de integrantes da corporação de 13 mil para 15 mil policiais. Segundo ele, isso repõe o efetivo histórico da PF. O anúncio foi feito no Palácio do Planalto, após uma reunião com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que autorizou a seleção pública.    

“Mais 2 mil policiais federais que serão distribuídos por todo o Brasil, muito importantes no combate ao crime organizado, na segurança das nossas fronteiras e no combate ao crime ambiental”, afirmou Lewandowski, detalhando que o presidente autorizou a chamada de mil profissionais em 2025 e mil em 2026. Ele estava acompanhado pela ministra da Gestão e Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck. Segundo ela, a portaria interministerial com a autorização para o concurso, incluindo o número exato de vagas e cargos, será publicada em até duas semanas.

As vagas serão distribuídas entre todos os cinco cargos da PF: delegado, escrivão, papilocopista, agente e perito.

“O presidente deu uma grande prioridade para esse concurso. E a gente está anunciando logo agora, antes de outros [concurso] que vamos anunciar ao longo do ano, para que eles ingressem o mais rápido possível. Tem todo um processo longo e a entrada efetiva deve ocorrer no final desse ano ou só no ano que vem”, informou a ministra.

Ainda segundo Esther Dweck, os cálculos do governo estão em linha com a economia de R$ 1 bilhão em concursos públicos anunciada pela pasta da ministra no final do ano passado, e que consta na Lei Orçamentária Anual, e não será afetada por essa nova seleção.  

Fonte: Agência EBC de Comunicação

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Previsão de temporal faz Rio estrear sistema de alerta da Defesa Civil

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A Defesa Civil do Município do Rio de Janeiro utilizou, por volta das 18h desta quarta-feira (29), o novo sistema de alerta que envia notificações a celulares da cidade. Os moradores foram avisados da previsão de pancadas de chuva, que se mantém até o fim da noite, e orientados a evitar áreas alagadas e a utilizar o número 199 em caso de emergência.


Brasília (DF), 29/01/2025 - Alerta enviado a celulares do Rio de Janeiro pela primeira vez nesta quarta-feira. Foto: Defesa Civil/Divulgação
Brasília (DF), 29/01/2025 - Alerta enviado a celulares do Rio de Janeiro pela primeira vez nesta quarta-feira. Foto: Defesa Civil/Divulgação

Brasília (DF), 29/01/2025 – Alerta enviado a celulares do Rio de Janeiro pela primeira vez nesta quarta-feira –  Defesa Civil/Divulgação

O sistema enviou uma notificação com o título “Alerta extremo”, que fez os celulares vibrarem e também tocarem um sinal de alerta, mesmo que estivessem no modo silencioso.

O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, também publicou a mensagem nas redes sociais, reforçando o aviso. Em respostas, seguidores parabenizaram a iniciativa e também relataram ter se assustado com o aviso, usado pela primeira vez na cidade. Em seguida, o prefeito respondeu com um vídeo, pedindo que todos se habituem com o novo sistema e se programem de acordo com as orientações.

“Estou recebendo um monte de mensagens de gente falando que quase infartou e morreu do coração, mas é bom a gente ir se habituando. Hoje, pela primeira vez, usamos um sistema que, independentemente de estar cadastrado ou não, se estiver em uma determinada área da cidade, ou em toda a cidade, a gente manda um alerta. É pra dar susto mesmo e chamar atenção. É para as pessoas se planejarem e não irem para uma área alagada”, disse o prefeito, em vídeo.

Sistema nacional

As mensagens fazem parte do novo sistema de alertas de desastres de grande perigo da Defesa Civil Nacional, que entrou em operação em dezembro do ano passado nos estados das regiões Sul e Sudeste e deve chegar a todo o país.

Os alertas são disparados para a população em área com cobertura de rede 4G ou 5G e com risco iminente de alagamentos, enxurradas, deslizamentos de terra, vendavais, chuvas de granizo e outras situações. As pessoas não precisam fazer cadastro prévio para receber as informações de autoproteção, ele será automático.

O conteúdo dos alertas é de responsabilidade da Defesas Civis de estados e municípios. Assim em uma determinada situação de previsão crítica de desastre, seja ele hidrológico, meteorológico, geológico, entre outros, esses órgãos poderão enviar o Defesa Civil Alerta para a população que estiver na área de risco potencial.

Pancadas de chuva

O impacto das chuvas, que já são registradas desde a tarde, levou o município a entrar no Estágio 2 de alerta, o segundo em uma escala de 1 a cinco, às 16h desta quarta-feira. O estágio indica que há risco de ocorrências de alto impacto.

O serviço de meteorologia do município Alerta Rio prevê que, nesta noite, o céu estará nublado na cidade do Rio, e há previsão de pancadas isoladas de chuva moderada a muito forte, acompanhadas de raios. Os ventos estarão fracos a moderados.

Fonte: Agência EBC de Comunicação

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Associação LGBTQIA Casarão Brasil lança calendário trans 2025

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A Associação LGBTQIA Casarão Brasil, sediada em São Paulo, lançou nesta quarta-feira (29), Dia Nacional da Visibilidade Trans, a edição deste ano de seu calendário, com homenagens às pessoas trans que têm alguma conexão com a entidade. Existente desde 2021, o calendário tornou-se também uma forma de fazer, mesmo que de modo simples, com que as pessoas de fora da comunidade de trans e travestis compreendam que se trata de um grupo diverso, o que contribui para se reduzir ideias estereotipadas.

A iniciativa contou com o apoio da Gilead Sciences do Brasil, que também colabora com outras ações do Casarão Brasil. A associação está ativa há 16 anos e desenvolveu um sistema bem articulado de atendimento, que combina serviços de moradia, educação, emprego, saúde e acolhimento psicossocial. Ao todo, são, em média, 1,3 mil atendimentos por mês.

Patrycia Pellegrini, de 52 anos, é o rosto que ilustra a página de novembro do calendário. A paulistana teve um percurso com uma surpresa agradável e que transformou seu cotidiano e sua autoestima. 

Por determinado período, enfrentou dificuldades de conseguir um emprego e, como muitas mulheres trans e travestis, tentou a vida no exterior. Retornou ao país de origem ao se sentir agredida com propostas que a colocariam sob um risco ainda maior, como profissional do sexo, e, na volta, conquistou um emprego no Casarão, que já tinha sido um ponto de refúgio para ela. A gestão da entidade percebeu que Patrycia tinha perfil para desempenhar uma das funções na equipe e a contratou.

Hoje, ela tem família constituída e mais tranquilidade, sabendo que tem autonomia financeira e que tem qualidades que podem ser valorizadas. O próximo plano, após ter concluído o ensino médio recentemente, é cursar serviço social. 

“A vida da gente, a gente quer que seja a melhor. Ter um espaço, uma moradia decente, dignidade para poder seguir”, sintetiza Patrycia. 

Também como muitas trans e travestis, viu muitas amigas se tornarem vítimas de violências, inclusive as letais. Apesar das conquistas e de ser plenamente respeitada no ambiente profissional, no seio familiar a transfobia ainda persiste. Parentes seus, espíritas kardecistas, até hoje a chamam pelo nome morto, ou seja, o de batismo e do gênero masculino, algo que a incomoda. 

Patrycia fez sua transição aos 18 anos, o que, lamenta ela, é tempo de sobra para terem assimilado. Para ela, representa um gesto reiterado de desrespeito.

Em relação às beneficiárias dos serviços oferecidos pela entidade, Patrycia assume ter tido sorte e busca estimulá-las a correr atrás do que querem para si, como ela fez. “Desejo que tenham como mudar, caminhar”, afirma.

“Eu nunca tive registro em carteira, tenho hoje, aos 52 anos. Por que elas não podem conseguir? Vão conseguir!”

 

Fonte: Agência EBC de Comunicação

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